quarta-feira, junho 14, 2006

"Felicidade sem utopia"

Há algum tempo que estou a tentar copiar uma entrevista que saiu na revista do Público a 12 de Fevereiro de 2005 por Laurinda Alves. O texto é bastante extenso por isso não o mostrarei integralmente. É só uma pitada, quem quiser aprofundar as ideias deste psiquiatra espanhol pode mergulhar nas suas obras.

"Psiquiatra de referência da actualidade, Enrique Rojas trabalhou em Nova Iorque com os familiares das vítimas e os sobreviventes do 11 de Setembro. Autor de inúmeros livros, é conhecido por teorizar sobre a felicidade.

É muito ambicioso teorizar sobre a felicidade, porque que é que decidiu escrever a sua teoria?
Primeiro trata-se apenas de uma teoria e não da teoria sobre a felicidade. Aquilo que escrevi é a visão de um psiquiatra espanhol que tem um ponto de vista particular sobre esse assunto. Da mesma maneira que Ortega e Gasset, filósofo espanhol, dizia que cada ser humano é uma visão da realidade, também esta é mais uma maneira de contemplar um tema eterno.

Qual é a sua particularidade?
A particularidade é que, para mim, a felicidade consiste em duas coisas: ter uma personalidade equilibrada e ter um projecto de vida. Isto, note-se, com três grandes valores incluídos: amor, trabalho e cultura. Em minha opinião a felicidade é o resultado de quatro grandes temas: a forma de ser, a vida afectiva, a vida profissional e a cultura.

Apesar de parecer uma soma simples, é uma matemática complexa…
Bem, a felicidade não consiste em somar e ter cada vez mais, mas na administração inteligente dos nossos desejos.

É preciso educar o desejo, então?
Insisto que, para mim, a felicidade consiste numa boa relação entre o que desejei e o que consegui.

Podemo-nos educar para a felicidade?
Efectivamente podemos. E como se pode educar? Tendo muito claro que quem não sabe o que quer não pode ser feliz. E saber o que queremos significa capacidade para ter objectivos, metas e planos concretos, coisa que acontece em cada um destes quatro grandes temas de que falei. A personalidade, por exemplo, é o cartão de visita de cada um de nós e, por isso, ter uma personalidade madura é um trabalho essencial. Em segundo lugar, a vida afectiva, ou seja, no campo dos sentimentos é importante conseguir um bom equilíbrio. Em terceiro lugar a vida profissional. Hoje há dois extremos: as pessoas que não têm trabalho e as pessoas que só têm tempo para trabalhar e a ideia é tentar viver num ponto intermédio. Em quarto lugar, a cultura: importa perceber que a cultura é a estética da inteligência.

Pode definir melhor este conceito?
A cultura é a curiosidade em ir crescendo por dentro, alargando os horizontes da nossa paisagem interior. Isto significa que cada um deve tentar nutrir-se de arte, literatura, pintura, poesia, fotografia…

Porque tudo isso é transformador?
Claro, muda o ser humano e, nesse sentido, a cultura é liberdade. Os clássicos diziam in libertas perfundet omnia luce que em latim, significa “ a liberdade enche tudo o que é luz”. A liberdade e a cultura são duas chaves essenciais para a felicidade. No mundo actual há muito pouca cultura porque a cultura precisa de tempo.

No seu livro fala da cultura da mediocridade.
È a cultura da classe média, que está muito associada à linguagem da televisão. O desejo apaixonado de conhecer a vida dos famosos, especialmente quando ocorre menos bem, é um sintoma desta cultura da mediocridade. Cada vez interessa mais a vida alheia dos conhecidos e interessa particularmente quando está desfeita ou em existem crises. Há morbidez no divertimento. Pôr o olho na fechadura e espreitar a vida dos ricos ou dos famosos para perceber que eles também choram e também sofrem é negativo. E medíocre.

Medíocre porque se trata de aderir a programas e pessoas de quem não se conhece uma ideia nem obra feita?
Exactamente. Não têm ideias nem fizeram obra mas são conhecidos porque aparecem na TV. Acredito que uma pessoa de prestígio é uma pessoa que tem uma vida harmoniosa, que se torna sugestiva ou atractiva porque revela coerência, porque ensinou alguma coisa aos outros ou deu um exemplo notável. E esta é que é a diferença. O problema é que a nossa sociedade está muito perdida. Os modelos de identidade são medíocres e muitas pessoas copiam esses modelos.

Voltando atrás, falava de quatro partes fundamentais em nós. Como, por definição, somos seres incompletos, pergunto como podemos tentar fazer mais e melhor?
Bem, é uma tarefa gradual e progressiva. Ou seja, o ser humano é e será sempre uma sinfonia incompleta. O homem é um animal descontente e, por isso, trata-se de não desistir de tentar ser mais feliz.

É este o nosso motor de vida?
È importante ter um programa, um projrcto de vida. Como disse há pouco, a felicidade consiste em ter um projecto de vida e o projecto de vida é um programa no qual eu introduzo os principais ingredientes segundo o meu ideal individual de felicidade.

Parece infinitamente mais fácil de dizer do que fazer…
É preciso não esquecer que eu, como psiquiatra, passo o dia a ver pessoas infelizes. Escrevi sobre a felicidade a partir da quantidade de vidas desgraçadas que vejo. Tentando dar o meu contributo para mudar a vida das pessoas para melhor.

Como é a sua vida?

Bem, sou um homem de cinquenta e muito anos, estou casado com uma notaria, tenho cinco filhos, tenho muito trabalho como médico, passo muitas horas aqui neste consultório, tenho uma boa equipa que trabalha comigo e sinto-me feliz porque tenho uma trabalho que me preenche, do qual gosto, que consiste em ajudar as pessoas a superarem as suas depressões, ansiedades, insónias, dificuldades. Neste sentido sou um homem realizado e feliz. "

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